terça-feira, 19 de julho de 2011

... O pulso ainda pulsa...


...ainda sinto o pulsar dentro das minhas veias; está mais fraco, mas ainda sinto.

Sei que será em breve, mas sabem daqueles momentos que cada segundo passa lentamente, e parece uma eternidade? Você olha para trás, para as coisas que você fez; para as coisas que você deixou de fazer; lembra de que deveria ter poupado mais dinheiro; lembra que deveria ter vivido mais a vida! Louca vida!

Me lembro de todas as coisas erradas que já fiz, e uma delas foi ter deixado meu amor ir embora! Agora cá estou eu, sozinho, nesta cadeira de balanço, olhando o movimento das pessoas na rua... esperando a hora do próximo remédio do coração, aquele que ataca meu fígado; por isso eu tomo aquele outro verdezinho... eles pensam que eu não sei o motivo! Mas eu sei! Aquele dali serve para cuidar do fígado que se estragou por minha vida boêmia... "cof cof cof cof..."

Esta tosse chata que não me deixa... espero que ninguém tenha escutado eu tossindo, senão vai ser outro remédio que irei tomar! Não aguento mais de tanto remédio: um branco quando acordo, às 10h outro amarelo, às 16 tem aquele xarope verde (argh)...que remédio ruim; E logo depois da novela das 18h a enfermeira entra no quarto para eu tomar aquele maiorzinho... é uma cápsula rosa-claro! Acho que é para minha memória, mas não lembro para que serve. Não tenho certeza. E agora o próximo, do coração. Coração cansado, trabalhador, sua validade está acabando.

É... e cá estou eu! Sem companhia, sem filhos, sobrinhos...humpf... estes são que não me visitam nunca! Acham talvez que velhice pega!

Então só me resta pensar na vida! Lembrar das coisas que eu fiz... daquelas que eu queria ter feito... e foram muitas coisas que eu deveria ter feito e não fiz! Ah.. minha cabeça ainda dói de tanta ideia que vem ao mesmo tempo, mas quando pego papel e caneta já não lembro mais do que tinha em mente momentos antes!

De tudo que já tive só me restam as memórias. Poucas sim, porém ainda vívidas em minha cabeça.

O sol está deitando no horizonte. Acho que também irei! Esperarei meu remédio lá no quarto! Além disso estou com este sono incontrolável e odeio que me vejam cochilando. Melhor ir para cama, mesmo com a minha bengalinha me ajudando... eu ainda consigo andar! Não preciso de ninguém me empurrando em cadeira de rodas! Só é ruim que da varanda para minha cama parece tão longe... Mas dá para ir.

Cheguei, deitei e agora é só esperar a enfermeira com meu remédio. Enquanto isso eu vou fechar os olhos e tentar descansar mais um pouco desta minha vida monótona! Sim! Errado estão os que acham que a vida monótona é boa! A monotonia cansa...! Não quero pensar mais em nada. Esperar as nuvens voarem pelo céu, e o Sol indo embora, para a Lua Cheia chegar...

Agora está chegando um sono profundo!... Mas justo agora?!... Gosto tanto de ver a lua alta no céu! Nunca tive este sono assim tão forte. É incontrolável! Ah, vou dormir! É melhor!

(...)

E assim foi encontrado o corajoso velhinho, deitado em posição de "sentido", com um controle remoto de tv em uma das mãos e a outra acomodada no peito. Jaz agora o paciente mais engraçado da casa de saúde! Ele sempre tinha uma palavra de consolo e sabedoria para quem o buscasse para se aconselhar! Velhinho esperto! Observador! Gostava de saber da última coisa que havia acontecido, a coisa mais recente... mantinha-se atualizado sempre!

Velhinho querido! Agora descansa em paz! Siga com Deus, Sr. Velhinho. Seja feliz onde quer que esteja! Quem sabe um dia serei eu em seu lugar... Quem sabe!... Vá com Deus e com todo o amor dos que fazem parte da casa de repouso geriátrica. Você será sempre bem querido de todos aqui e com certeza deixará muitas saudades! Mas siga em frente! Sempre em frente! E não se preocupe que seu pedido de velório será atendido. Vou vestí-lo com aquela bermuda e a camisa florida! E no seu velório só cantará música alegre. O senhor não gostava de sofrimento! E assim será! Todos felizes e sorrindo em sua homenagem, sempre tão brincalhão e sorridente! E que assim seja!


Flávio Augusto Albuquerque

quinta-feira, 14 de julho de 2011

De repente.... em repente...!


"Quando tal sujeito te disser
e com certeza assegurar,
que algo ruim pior não pode ficar,
manda-lo 'lá' tomar,
pois da tua cara onda ele deve estar a tirar!"


"A ti te dou a Lua, como prova do meu imenso amor!
E as estrelas do céu peço em consignação,
com promessa de devolução uma por uma,
logo após tê-las como nobres testemunhas
deste pobre homem, com o maior, mais forte
e mais belo dos sentimentos, nutrido com fervor!
És tu, oh, meu verdadeiro amor!"



"Mas até a Lua parceira se frustrou
e mesmo que não queira, se entocou
por entre as nuvens do céu cinzento
só para não passar constrangimento
de ter se preparado e se empiriquitado
para admirar lá de seu lugar, o belo casal
a ponte cruzar, mas só o que viu
foi o plano fracassar!"


"Pelo jeito que hoje estou, parece a mim
que o bicho da rima me picou,
e agora amaldiçoado estou...
a rimar e a contar uma a uma as palavras,
para que a prosa vire então uma leve canção"


Flávio Augusto Albuquerque

quarta-feira, 13 de julho de 2011

A última viagem... antes da próxima!

Quarenta e cinco minutos desde o ponto de partida até a chegada; 11 pessoas sentadas, nenhuma em pé; sobem 30 pessoas, descem 15. Sobem 18 e 5 ficam em pé! Vinte paradas desde o início da viagem até o final. Quinze faróis abertos, 20 fechados e 12 amarelos. Sessenta e três esquinas. Trinta e dois km de distância.

Vários números e diversas combinações interligadas; uma alteração em uma dessas variáveis e muda todo o restante! 97 bocejos; 15.357 piscadas de olhos; Noventa e uma árvores com 317 postes: é a cidade tomada pelo caos da evolução!

A chuva continua... 721.319 pingos desde a "cumulus nimbus" de origem até o chão, caindo ao mesmo tempo. Nove litros de água do céu a cada cerca de 14 minutos. Sistema de boeiros e escoamento que comporta apenas 7 litros a cada 20 minutos. Resultado: lama, poça d'água, alagamento; caos! Duzentos e dezenove carros na mesma direção, com sentidos diferentes numa mesma via. Do outro lado, 57 carros na mão contrária.

Milhares de vírus e bactérias voando pelo ar, invisíveis, sendo repassados de uns para os outros através de tosse, espirro, contato com cédulas e moedas, corrimão de ônibus, assentos de cadeiras, apertos de mãos...; Vírus e bactérias que muitos já estão imunes, e outros tantos que são novos, modificados, evoluídos... Matam-se os homens a cada dia, a cada instante: Renovação x Destruição; Renovação + Destruição; Renovação = Destruição...

Tantos detalhes, tantas possibilidades, tantas informações, tantas escolhas... e só ele observa tudo isso e analisa, sem ser visto nem notado! Do mesmo modo que os vírus e bactérias, ele transita por entre os outros passageiros, esbarrando em uns, desviando-se de outros, até chegar ao seu local e parar! Ele permanece calado, quieto, sentado, ouvindo, vendo, calculando... Quantas possibilidades existem de acontecer um acidente? E se for uma capotagem? No lado direito ficam as portas; funcionam aquelas saídas de emergência? E no lado esquerdo? “Puxe a alavanca e empurre a janela!” Alguém já testou aquilo?

Quantas pessoas no lado de fora a esperar a chegada de seus ônibus! O que será que se passa na cabeça delas? Será que alguém está pensando em algo? Ele divaga e volta para os seus pensamentos. Lembra que quando não quer pensar em nada apenas ouve uma música em sua mente e fica com o olhar vago... as pálpebras se fecham... o frio da chuva abaixa a temperatura no coletivo até ele dormir! Dormida de sono inquieto, vigilante para não passar do seu ponto. O ponto de sempre. O ponto que chega. E agora, embaixo da chuva, e após todo o tempo da viagem, ele volta à sua casa com mais um dia terminado. Mais uma vez dormir sozinho, até a hora de amanhecer, e começar tudo outra vez!...

(...)


Quarenta e cinco minutos desde o ponto de partida até a chegada; 11 pessoas sentadas, nenhuma em pé; sobem 30 pessoas, descem 15. Sobem 18 e 5 ficam em pé! Vinte paradas desde o início da viagem até o final. Quinze faróis abertos, 20 fechados e 12 amarelos. Sessenta e três esquinas. Trinta e dois km de distância.


Flávio Augusto Albuquerque